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1º de Maio - Dia do trabalho: comemorar o quê?



Dia 1º de Maio. Dia do Trabalhador. Em pleno século XXI, ano de 2018, a reflexão continua a mesma de 20 anos atrás que me foi invocada pela música Capitão da Indústria de composição do Marcos Vale e interpretada pelo Paralamas do Sucesso.

“Ah, Eu acordo prá trabalhar Eu durmo prá trabalhar Eu corro prá trabalhar

Eu não tenho tempo de ter O tempo livre de ser De nada ter que fazer”

O verbo “trabalhar“ está tão em uso hoje como no século XVIII, época da Revolução Industrial, que demarcou um processo de grandes transformações econômicos-sociais. O modo de produção em série, insere o Homem na mecanização dos tempos e movimentos e a tecnologia daquele período inicia uma captura da subjetividade, emergindo o binômio Homem-Trabalho. A Revolução Industrial, que logo atinge todas as grandes nações mundiais, coloca o Trabalho em um patamar de hipervalorização e a produtividade do sujeito começa a ser mensurada pela capacidade [utilidade] produtiva. Porém, esse “suposto trabalho em busca da utilidade”, significa, na verdade, estar inserido no grupo social dominante e encaixar-se nas caixinhas significa êxito.

Logo, torna-se recorrente a expressão “trabalhar o corpo”, “trabalhar a mente”, “trabalhar uma alimentação mais saudável”, “trabalhar as emoções”, entre tantas outras, as quais, a princípio são inócuas, mas que desvela danos psicológicos pela sobrecarga de trabalho e pela característica quase adjetiva “eu não tenho tempo”. Entretanto, o panóptico empresarial vigia pelo ponto eletrônico as horas trabalhadas, ou melhor, que “temos tempo para trabalhar”. Será que trabalhar pode ou deve estar permeando tantos aspectos das nossas vidas?

Na atualidade, tornou-se comum o comportamento de deixar de lado algumas atividades familiares e coletivas para uma dedicação aos projetos do trabalho e ao planejamento de carreira. Faz-se pertinente ressaltar que o trabalho, além de ocupar grande parte da vida dos indivíduos, promove ambiguidade nesta relação, o que incide a necessidade de resgatar a historiografia do Trabalho.

Analisar as estruturas e demandas sociais, conduz os indivíduos ao silenciamento da sua subjetividade, promovendo uma relação de simbiose onde as fronteiras de trabalho, vínculos e vida pessoal ficam indissociáveis. Conseguimos identificar os momentos de felicidade que dão sentido a nossa vida quando o sentido de trabalho se faz presente em tudo?

Na consulta online do clássico dicionário Aurélio apresenta as seguintes definições sobre Trabalho e Tempo (FERREIRA, 1999):

Trabalhar:

  • verbo predicativo intransitivo - ocupar-se em algum trabalho; ter um trabalho.

  • Verbo transitivo indireto e intransitivo - empenhar-se para executar ou alcançar; "trabalhou sem descanso na redação do projeto"

Tempo – substantivo masculino - duração relativa das coisas que cria no ser humano a ideia de presente, passado e futuro; período contínuo no qual os eventos se sucedem. Usualmente utilizado nas expressões determinado período considerado em relação aos acontecimentos nele ocorridos; época.

"o tempo. das grandes descobertas".

A complexidade epistemológica de avaliar o Trabalho e o Tempo explica a demasiada ocupação na vida das pessoas, ou melhor, dos trabalhadores. Bauman (2001), em sua obra “Globalização: as consequências humanas”, anuncia e explica a teoria de “compreensão do espaço e tempo” por representações da imobilidade dos dominados e a organização espacial como aparelho opressor. Essa teria toma a globalização como fenômeno [objeto] da acelerada produtividade e do instantâneo cultural, reforçando a mecanização dos tempos e movimentos e alargando o distanciamento entre as classes alta e baixa, respectivamente, donos de meio de produção e trabalhadores.

Qual o impacto que o Trabalho fomenta em tempos de globalização, pós modernidade, informação em tempo real e tal, tal tal? Adoecimento. Apesar de todo conhecimento acerca do trabalho e trabalhar o chamado coração da empresa ou órgão vital para a empresa funcionar sua Excelência, a gestão de pessoas promove ‘capacitação’ (dilema entre habilitação e aptidão) para o desenvolvimento de equipes de alta performance, liderança, coaching, gerentes eficazes, vendedor de sucesso entre tantas outras publicações de autoajuda empresarial. O sofrimento psíquico no trabalho e o contexto sócio capitalista ofuscam os crescentes comportamentos de assédio moral, assédio sexual, somatização/sofrimento psíquico e adoecimento em função da psicodinâmica do trabalho anunciados por Dejours na década de 80, ou seja, a relação entre Trabalho e Saúde.

Juridicamente, avanços e retrocessos indiscutíveis, cujo maior golpe foi na alteração Recente da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Por outro lado, novas leis tentando coibir os assédios, humilhações, enfim, a desumanização e objetificação do trabalhador.

Então, hoje, dia primeiro de maio, o que temos para comemorar?

O IBGE (2018) revela que somos 12,7 milhões de desempregados, pessoas que vivem um sofrimento fruto da ausência de trabalho formal, vivendo com as incertezas do amanhã. Cabe, então, a pergunta: o que esses milhões de desempregados estão comemorando?

Somos seres complexos, da falta, da busca, dos encontros e desencontros e o rotor da existência, ou melhor, a questão fundamental desde os pré-socráticos a Caetano Veloso em Cajuína: “Existirmos a que será que se destina?” Sem dúvida, o trabalho nos dignifica, mas quando o fazemos com olhar empático e responsabilidade social.

É o momento de assumir o desafio de superar a liquidez dos vínculos que tem nos regido e à sociedade e nos ressignificarmos e a tudo que fazemos. Portanto, é preciso refletir sobre o lugar de cada um e sobre o que significa comemorar nos tempos de hoje.

Afinal, comemorar o quê?

Referências Bibliográficas

Bauman, Z. (2001). Globalização: as consequências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.

Dejours, C. (1994). Psicodinâmica do trabalho: contribuições da escola dejouriana à análise da relação prazer, sofrimento e trabalho. São Paulo: Atlas.

Ferreira, A. B. H. (1999). Dicionário Eletrônico Aurélio Século XXI. [CD-ROM] versão 3.0. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira e Lexikon Informática.


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